NADA MAIS NÃO
Andou lá pela ilha acampada.
Rápido. Carnaval. Corrida a
jato.
Comeu churrasco.
Cozinhou mariscos. Enjoou.
Bandas do Jurerê sem samba.
Tudo de leve muito elegante
bermudas shorts maiô
óculos escuros sem chapéu de
palha
muito Garbo. Sem fotógrafos
nem autógrafos.
Esvoaçava
cortejo de arco-íris
verde azul dourado.
Volta lírica. Faz poesia
açucarada
renascença da eterna
adolescente.
A onda carrega a máscara
da ironia agressiva.
O sol vence a peneira de areia
movediça
afunda. Mergulha em
nuvens.
Tudo confuso. Absoluto. Sem
divisões.
Ela era. Descoberta sem
alaridos.
Dissipam-se as dúvidas,
nuvens...
Clareza sem pensamento.
Emoção a escorrer, a dissolver
a
casca. Brotava. Era ela.
Um menino
sentado. Cabeça erguida.
Estava ao
seu lado. Não a via. Olhava
a praia e
crescia. Agigantava-se.
Ela
diminuía. Era uma concha
uma
pedrinha branca. O gigante, um
simples
homem. Avermelhado.
Um pouco
calvo. Algo o incomodava.
Mudou de
posição. Alisou o cotovelo.
Sorriu
acariciou entre os dedos a malva-
da.
Inofensiva, macia. A pedrinha fi-
cou
rosada, rara, pensou. Daria um
anel.
Ingenuidade. Igual às demais.
Arremessou-a
ao mar. Má pontaria.
Apenas um
salto. Vexado. Nunca acontecia
aquilo.
Queria o triplo. Tateou no limo.
Nada.
Sumiu a segunda chance.
Fugiu.
Mudou de ares em outros mares.
Na maré pisou o pé. Desgraçada
de
pedra. Merda. Uma navalha.
Improvisou a barba. Sangrou.
Ia jogar fora. Não. Podia
machucar
outros. Confiada. Sorrateira,
sanguinária,
aguda. Canivete de unha!
Guardou no bolso decidido.
Pedra fardo. Andava arrastado.
Tentou
desvencilhar-se. Era tarde.
Escurecia.
Entrou em casa algemado.
Dormiu.
Acordou surpreso !?!
Deu de cara na cama com uma
mulher estranha.
Delirava? Que pedrada!
Um dia
distraído voltou o menino à praia.
A seus pés
gelada, toda molhada
a pedrinha
rosa desbotada.
Sorria ou
chorava?
Apenas uma
menina jogada na areia
Nada mais
não. Foi embora. Era um homem.
Abriu a
porta. E o fantasma da menina
morta dominava
numa mulher viva
multiplicava-se.
Uma chuva de granizo
rosado o
provocava. Fez um colar.
Era
carnaval. Seguiu um bloco.
Na
Quarta-feira de cinzas entrou. Fechou
a porta. A
pedra afiada o esperava.
Na
Quinta-feira arrebentou o colar, enforcou-se
com uma
gravata e seguiu para a
Candelária.
Ela já era. E ao seu lado
continuava um menino
sentado...um gigante.
Lógica do meio tempo:
Um homem e uma mulher
petrificados
Coisas de praia.
Nada mais não.
Mas a
Pedrinha branca vem à tona:
Jogada ao
mar. Não sabia nadar. Afundava
no limo.
Mordida. Água viva. Precisava subir.
Se boiasse
estaria salva. Tossia. Ia morrer
sozinha.
Esquecida. Afogada na praia
da Saudade
ou do Continente entre
coqueiros?
Não, continente estreito.
Presença
de alguém finalmente.
Reconheceu
a mesma mão. Tremeu. Não.
Vai
jogar-me novamente. Jogo pra assistência?
Ambulância.
Cheiro de éter. Lança perfume.
Vomita gente. Vozes cada vez mais perto.
Ilusão
deserta. Milagre. Deu na praia viva.
Escorria,
corria, corria. Tropeça.
Dá de cara
com um guarda. O que fazia
aquela
hora? Tonta de xereta? Xereta?
Meta-se
com a sua vida. Era o chefe de onde?
Memória
fraca. Uma menina abandonada.
Estória de
carochinha. Uma charrete voava.
O guarda
açoitava os corcéis. Presa nas
grades da
Igreja. Grávida. Grávida. Grávida.
Um menino
um menino um menino.
Onde
estava o homem? O primeiro menino?
O gigante?
Delirava? O guarda espiava.
Era um
louco? E o outro? O outro? O outro?
Os meninos
jogavam bola ou pedra?
Na praia
ou no mar? Cega, cega, cega
a mulher
verde-amarela. Alguma sereia?
Escrevia
na areia perdida. A onda levava.
Apagava a
vida. O passado voltava.
Desmaia.
Ao longe diluindo-se um olhar
conhecido?
Indiferença. Esperança desfeita.
Impossível.
Pior abrir os olhos. O guarda a
carrega no
colo e faz seu enterro. De visita
três
meninos homens. Gigantes que se despendem
sem beijos
sem flores. Há um ramo invisível de
oliveira.
Perfume de azeitona. Engano.
Está seco.
Entre os dedos uma “madre-silva”
murcha
como muitas. Um palácio rosa
delineia-se
sem princesa. Uma figueira de
muletas
perto da igreja. Símbolo da
paralisia
da menina. Pedras na janela.
O vento
entra pelas frestas e anuncia
Perverso:
suicídio na Candelária
do Rio de
Janeiro. Roxo, o homem vermelho,
quase
verde, amarelo. Encontrado
dentro de
uma Caixa enforcado com
uma
gravata.
Uma menina enterrada viva
se levanta. Uma mulher
estranha joga cartas
enigmáticas, sozinha pela
vida.
O fantasma do guarda se
agiganta.
Incêndio
na Caixa Econômica
Agência
Candelária
Motivo: Um funcionário
atiçou
fogo num maço de cartas
de amor e matou em si
o jovem destinatário de 20
anos e colocou o cadáver
no lugar da correspondência.
Fez os cálculo descontou os
20 anos e está outro, leve
disposto, rendendo o dobro,
investindo adoidado.
Nada mais não!
MPerez - Década de 70, escrito em Balneário Daniela-Fpolis-SC. Publicado em 28/11/2014-Rio das Ostras-RJ